sábado, 29 de janeiro de 2011

DAVID CONTRA GOLIAS – OS PAIS E O ESTADO

Nos últimos tempos, temos vindo a ver, ouvir e ler sobre um movimento cívico de Pais e Encarregados de Educação – o Movimento S.O.S – que, de Norte a Sul do País, tem saído à rua em defesa das escolas com contrato de associação. O que pretendem e defendem estes Pais? O que está em causa?

Está em causa defender a Educação livre e a pluralidade de escolas e projectos educativos, para todos, e a sua livre escolha por parte dos Pais e Encarregados de Educação. Está em causa combater uma educação segundo um modelo único, em que o Estado impõe a sua orientação ideológica, à semelhança do que sempre aconteceu e acontece em todos os estados totalitários. Está em causa exigir um Estado servidor da cidadania democrática e bom administrador do que é de todos.

O Secretário de Estado, João Trocado da Mata, a propósito da luta deste Movimento, veio a público afirmar que os pais estão a defender “a manutenção de privilégios adquiridos e de margens de lucro intoleráveis”, insistindo que “o financiamento destas escolas deve ser equivalente ao do ensino do Estado”. O mesmo tem dito a Ministra da Educação. Certamente, ao ouvi-los, em horários nobres, a dizer tais coisas, tão pausadamente, muitos ficam convencidos de que eles estão cheios de razão. Outros ficam profundamente revoltados com as enormes distorções da realidade que as suas belas palavras escondem.

É que, na verdade, o que os Pais, alunos e funcionários das escolas com contrato de associação querem e andam por aí a defender é, exactamente, a justiça e a igualdade de tratamento na distribuição dos recursos entre escolas estatais e outras escolas (públicas na qualidade e gratuitidade do serviço que prestam) com contrato de associação. Estes pais não defendem privilégios especiais e margens de lucro! Afinal, onde está o problema, se parecem querer e dizer ambos o mesmo – Ministério da Educação e Pais?

Alguém está muito equivocado ou, então, alguém anda, de má fé, a faltar à verdade, para ficar bem na fotografia para a opinião pública. Por trás das palavras, há factos e atitudes. Então, deixemo-nos de belas palavras e falemos, apenas, de factos concretos e demonstrados.

Eis, pois, alguns factos (apenas 9) que podem contribuir para lançar alguma luz sobre este assunto.

1 - O partido do Governo chumbou, sem justificação válida, a proposta dos partidos da oposição de se constituir uma comissão independente para apurar os custos do ensino estatal e do ensino com contrato de associação. Teria medo de alguma coisa? Medo da verdade?

2 - Os últimos números conhecidos relativos aos dois tipos de ensino, apresentados publicamente por uma entidade internacional – a O.C.D.E – indicam claramente que um aluno no ensino com contrato de associação fica, por ano, cerca de 1000 euros mais barato ao Estado e, consequentemente, aos contribuintes, do que um aluno no ensino estatal. Isto significa que, só tendo em conta este diferencial, as escolas com contrato de associação já poupariam, por ano, ao Estado, muitos milhões de euros. Ninguém do Governo ou do Ministério da Educação desmentiu estes dados ou explicou porque é que devemos descartar estes números da O.C.D.E, como foram obtidos e quem os forneceu e apurou.

3 - Estudos já realizados demonstram que as escolas com contrato de associação ficam muitíssimo mais baratas ao Estado e, evidentemente, aos contribuintes, do que as escolas estatais (a título de exemplo: O Ensino Privado, da autoria de Jorge Cotovio, Editora UCP). Ainda não veio ninguém a público contradizer nenhuma das conclusões deste e de outros estudos.

4 - Da parte das escolas com contrato de associação sabe-se quanto gastam, em que gastam e de quanto precisam para sobreviver e pagar aos seus trabalhadores. Aliás, tem sido dito, aberta e publicamente, pelas Direcções destas escolas, quanto recebiam por turma e quanto o Estado quer que passem a receber.

5 - O Estado pretende que as escolas com contrato de associação passem a receber menos 30% do que o que recebiam, em média, até aqui. Em tempos de crise, o Estado diz diminuir o orçamento das escolas estatais, umas vezes em -5,5% e outras em -11%. Diferente de -30%, não é? Cortes muito pouco equitativos!

6 – Todas as escolas são diferentes e as suas despesas também: o montante atribuído tem de garantir os vencimentos de todos os trabalhadores, de acordo com a sua categoria própria e tempo de serviço (que, para o mesmo tempo de serviço e categoria profissional ficam aquém dos vencimentos dos trabalhadores das escolas do Estado), o retorno para o Estado dos impostos devidos, a manutenção das instalações e equipamentos (que, tal como os vencimentos e tempos de serviço, também variam consoante as escolas). Ora, a quantia que o Estado pretende atribuir é igualzinha para todas as escolas com contrato de associação, independentemente das diferenças assinaladas.

7 – Parece ser grande problema, para o Estado (de acordo com declarações da Ministra), que as escolas com contrato de associação criem infra-estruturas e actividades de enriquecimento curricular superiores às que as escolas do Estado oferecem (ainda que com menos dinheiro e pedindo ajuda às comunidades envolventes). A Ministra deu a entender que o Estado terá gasto mais nestas escolas com contrato de associação, mas, mais uma vez, omitiu custos concretos. O Estado não admite que possa haver gestão privada mais eficaz que “faça sombra” à sua gestão “pública”? Então, prefere asfixiar as boas iniciativas da sociedade civil, ainda que estas poupem o dinheiro dos contribuintes?

Evidentemente, se vier a demonstrar-se que nalguma destas escolas há má gestão de dinheiros públicos, então que se actue, de imediato e com firmeza, caso a caso.Generalizar é um erro grosseiro. Cabe ao Estado fiscalizar com rigor e agir em conformidade.

8 - Da parte do Estado, acerca de quanto gasta, efectivamente, nas escolas estatais, ainda não foram apresentadas contas públicas, transparentes e claras. Atirar insinuações para o ar (de que são os outros que gastam recursos indevidos), sem dados concretos sobre os gastos próprios, é má-fé e incompetência.

9 – De concreto, sabe-se, apenas (embora o Estado não o divulgue), que as escolas estatais requalificadas ou recentemente construídas, pagam uma renda mensal de cerca de 2 Euros por metro quadrado à Parque Escolar – uma empresa “pública” criada pelo Estado em 2007, que está a tornar-se mais um espantoso sorvedouro dos nossos impostos. A título de exemplo, tivemos conhecimento de que uma escola estatal de Leiria pagou, por mês, à Parque Escolar, já em 2010, 30000Euros+IVA (e ainda mais 4000Euros/mês+IVA, para equipamento de videovigilância). Estes números das rendas deverão integrar, com transparência, o apuramento dos custos das escolas do Estado.

Estes pais, alunos e funcionários do Movimento S.O.S. querem justiça e igualdade de tratamento e ficariam satisfeitos se tal acontecesse. Neste seu exercício de cidadania, eles visam, apenas, três objectivos:

1 – Que o Estado permita o apuramento isento dos custos numas e noutras escolas e que as contas sejam apresentadas com clareza e transparência, a todos os cidadãos;

2 – Que o Estado fiscalize e financie, com justiça e equidade, tanto as escolas estatais quanto as escolas com contrato de associação (umas e outras estão, obrigatoriamente, abertas a todos os alunos e acolhem-nos segundo critérios claros e previamente definidos);

3 - Que o Estado garanta a livre escolha das escolas pelos Pais, conforme lhes está garantido na Constituição da República e na Declaração Universal dos Direitos do Homem.

P. Pedro Mendes, sj

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